A base causal é desconhecida. As muitas tentativas de identificarem uma causa biológica ou psicossocial têm sido obstruídas pela heterogeneidade da população de pacientes definida por qualquer dos sistemas diagnósticos disponíveis e fundamentais na clínica, incluindo o DSM-IV. Os fatores causais podem ser divididos artificialmente em fatores biológicos, genéticos e psicossociais. Esta divisão é arbitrária em razão da probabilidade de os três campos interagirem entre si.
 

Fatores Biológicos

Substrato Neural
Só recentemente começaram a ser elucidados os mecanismos neurais que regulam o estado de humor. Não é surpresa, portanto, que as principais teorias que procuram explicar a fisiopatologia dos distúrbios afetivos tenham-se originado da elucidação dos efeitos farmacológicos das drogas antidepressivas.
Na década de 1960 foi proposto que a depressão era causada por diminuição da noradrenalina cerebral, e que tratamentos antidepressivos eram eficazes por normalizar essa neurotransmissão. Pouco depois algo semelhante foi proposto em relação à serotonina. Estas duas propostas compõem o que pode ser denominada de teoria monoaminérgica clássica da depressão.
As vias monoaminérgicas
Embora o reconhecimento da participação de monoaminas como neurotransmissores centrais seja anterior, foi no início da década de 1960,com a introdução de histofluorescência, que a neuroanatomia dos sistemas monoaminérgicos centrais começou a ser esclarecida. Verificou-se que três destes sistemas, o noradrenérgico, o seronérgico e o dopaminérgico, têm características semelhantes: todos se originam em núcleos localizados no tronco cerebral e se projetam para amplas áreas do prosencéfalo. Os neurônios noradrenérgicos, localizados na maior parte em um núcleo bilateral pontino denominado de locus coeruleos  (pela cor azulada que pode ser vista em cortes, mesmo a olho nu), mandam projeções ascendentes através de dois feixes: o dorsal e o ventral.

Já os neurônios serotonérgicos  estão em núcleos que, por se localizarem na região média do tronco, foram denominados núcleos da rafe. Inicialmente foram descritos nove agrupamentos de neurônios serotonérgicos, denominados de B1 a B9. Mais recentemente técnicas de imunoistoquímica também esses neurônios na área postrema, no locus coeruleos caudal e no núcleo interpeduncular. As projeções serotonérgicas ascendentes partem de dois desses núcleos, localizados na transição entre a ponte e o bulbo: o núcleo mediano da rafe (NMR, equivalente ao grupo B8) e o núcleo dorsal da rafe (NDR ,equivalente ao grupo B7).Os neurônios do primeiro enviam fibras de maior calibre, que formam os contatos sinápticos clássicos, para áreas como hipocampo e outras regiões límbicas. Já as projeções da NDR são constituídas por fibras finas, com varicosidades que não formam contatos sinápticos clássicos, mas sim parecem funcionar por liberação do transmissor no meio com sua difusão até os receptores/ células alvo, e inervam o estriado, parte ventral do hipocampo e matéria cinzenta periaquedutal dorsal. O córtex recebe projeções de ambos os núcleos. Estas projeções são bastante densas, pois, apesar do número relativamente restrito de neurônios serotonérgicos, calcula-se que uma entre 500 sinapses do córtex utilize serotonina como neurotransmissor.
Além da serotonina e da noradrenalina, outros neurotransmissores, incluindo a dopamina, o glutamato, neuropeptídeos como a colecistocinina (CCK) e o hormónio liberador de corticotrofina (CRH), e mesmo factores de crescimento como o BDNF(fator neurotrófico derivado do cérebro), têm sido implicados na etiologia dos distúrbios afetivos.
Neurotransmissão noradrenérgica
 A noradrenalina é uma catecolamina cuja síntese se inicia com a captação ativa do aminoácido l-tirosina. Esse aminoácido é transformado, pela ação da tirosina hidroxilase, primeiro em l-DOPA e posteriormente, pela ação da l-DOPA descarboxilase, em dopamina (DA). A dopamina é captada pelas vesículas sinápticas e, sob a ação da dopamina beta-hidroxilase, transformada em noradrenalina(NA). Quando se dá o impulso nervoso, o NA é liberado por processo de exocitose.    Pós-sinapticamente pode atuar em receptores chamados de alfa-1, alfa-2 e beta. Existe, ainda receptores pré sinápticos  noradrenérgicos inibitórios, de tipo alfa-2, que estão localizados tanto nos terminais como nos corpos celulares. Todos esses receptores estão ligados a proteína G. o principal mecanismo da retirada da noradrenalina da fenda sináptica é o da recaptação pelo terminal nervoso. Sua degradação intraneuronal ocorre pela enzima neuroaminoxidase (MAO), sendo um de seus principais metabólitos o 3-metoxi-4-hidroxifeniletileno glicol (MHPG).outra enzima envolvida na degradação da NA é a catecolortometiltransferase (COMT).Embora a localização celular dessa enzima não seja ainda bem conhecida, alguns autores sugerem que seja predominantemente extracelular. Os  números na figura ilustram o local de ação dos diferentes fármacos que codificam a neurotransmissão noradrenérgica. São eles:
1) Alfametilparatirosina; inibidor competitivo da enzima tirosina hidroxilase, passo limitante na síntese da noradrenalina
2) Reserpina; depleta calecolaminas por impedir a entrada da dopamina (ou da noradrenalina que foi captada) na vesícula sináptica. Com isso essas aminas são degradadas pela MAO.
3) Anfetamina; promove liberação e impede a recaptação de catecolaminas
4) Clonidina; agonista de adrenoreceptores de tipo alfa-2
5) Prazosin; antagonista de adrenoreceptores de tipo alfa-1
6) Propranolol; antagonista  de adrenoreceptores de tipo beta( 1 e 2 )
7) Desipramina; bloqueador seletivo de recaptação de noradrenalina
8) Moclobemida; inibidor reversível da MAO

Neurotransmissão serotonérgica
 A serotonina, ou 5-hidroxitriptamina (5-HT) é uma indolamina cuja síntese se inicia pela captação ativa do aminoácido triptofano. Ao sofrer ação da enzima triptofano hidroxilase, é transformado em 5-hidroxitriptofanoe, quase imediatamente, transformada em 5-HT pela ação de uma descarboxilase de aminoácidos. A 5-HT é captada pelas vesículas sinápticas. Quando se dá o impulso nervoso, é liberada por processo de exocitose. Pós-sinapticamente pode atuar em receptores chamados de 5-HT1(A,B,D ou E), 5-HT2(A,B ou C), 5-HT3, 5-HT4, 5-HT5(A ou B), 5-HT6 ou 5-HT7. Existem ainda receptores pré-sinápticos inibitórios, os de tipo 5-HT1A, nos corpos celulares, e os tipos 5-HT1B ou 1D (dependendo da espécie ), nos terminais nervosos dos neurônios serotonérgicos. Todos esses receptores, à exceção dos 5-HT3, ligados a canais iônicos, estão relacionados a proteína G. o principal mecanismo de retirada da 5-HT da fenda sináptica é a recaptação pelo terminal nervoso. Sua degradação intracelular ocorre pela enzima monoaminoxidase (MAO), sendo um de seus principais metabólitos o ácido 5-hidroxiindolacético (5HIAA). Os números na figura ilustram o local de ação de diferentes fármacos que modificam a neurotransmissão serotonérgica. São eles:
1) Paraclorofenilalanina(PCPA); inibidor da enzima triptofano hidroxilase, passo limitante na síntese de 5-HT
2) Reserpsina; depleta 5-HT por impedir sua captação pelas vesículas sinápticas. Com isso é degradada pela MAO
3) D-fenfluramina; promove liberação e impede a recaptação de 5-HT.
4) Buspirona; antagonista parcial de receptores 5-HT1A
5) Ritanserina; antagonista de receptores 5-HT2( A e C).
6) Ondansetron; antagonista de receptores 5-HT3.
7) Fluoxentina; bloqueador seletivo de recaptação de 5-HT
8) Moclobemida; inibidor reversível da MAO

Teoria do desbalanceamento de receptores de serotonina nos distúrbios afetivos
 O psiquiatra inglês John F.W.Deakin propôs a hipótese do desequilíbrio de receptores de serotonina como causa dos distúrbios afetivos. Segundo ele, esses distúrbios seriam causados por uma deficiência de neurotransmissão mediada por 5-HT1A e/ou um excesso daquela mediada por 5-HT2. Dados experimentais mostram que a estimulação de receptores serotonérgicos pós-sinápticos de tipo1A ou 2 desencadeia efeitos opostos em, por exemplo, sono, comportamento sexual, regulação da temperatura, síndrome serotonérgica e analgesia induzida por morfina, enquanto o bloqueio de receptores 5-HT2 potencializa os efeitos 5-HT1 na secreção da prolactina, excitabilidade neuronal e atividade locomotora.
Uma das funções principais do sistema serotonérgico seria a de modular respostas do organismo perante eventos oversivos, mas diferentes subsistemas teriam diferentes papeis. A estimulação da via serotonérgica oriunda do núcleo mediano da rafe e que se projeta, dentre outros locais, na formação hipocampal , região rica em receptores pós sinápticos de tipo 5-HT1A, produz déficits de aprendizado em algumas tarefas em animais de laboratório. Deakin sugere que. Por um mecanismo de desconexão de eventos oversivos de suas consequências emocionais, este sistema permitirá a um animal submetido a evento oversivos persistentes continuar a desempenhar suas atividades habituais. O sistema desempenharia ,assim, papel fundamental no desenvolvimento de tolerância ao estresse . em analogia com situações clínicas , o bom desenvolvimento desse sistema permitiria, por exemplo, a uma mulher de alcoólatra continuar a exercer suas atividades normais, interagir com outras pessoas e divertir-se com seus amigos, apesar de eventual comportamento inadequado e persistente do companheiro. Uma falha neste sistema estaria relacionada no aparecimento de quadros depressivos. O envolvimento de receptores de 5-HT2 nos distúrbios afetivos ocorreria de forma indireta. Um excesso de neurotransmissão mediada por este receptor na amígdala e no córtex frontal levaria a uma exacerbação da repercussão emocional de estímulos aversivos , efeito oposto ao desempenhado pela neurotransmissão mediada por 5-HT1A..

Fatores Genéticos
Os dados genéticos indicam fortemente que um fator significativo é a herança genética. Entretanto, o padrão da herança genética dá-se, evidentemente, através de mecanismos complexos: não apenas é impossível excluir efeitos psicossociais, mas fatores não-genéticos provavelmente exercem papéis causativos no desenvolvimento dos transtornos do humor em, pelo menos, algumas pessoas.
Estudos familiares
Descobertas repetitivas que os parentes em primeiro grau de probandos com transtorno bipolar I estão 8 a 10 vezes mais propensos que os de pacientes com transtorno depressivo maior. Assim, revela-se que a possibilidade de ter um transtorno bipolar diminui à medida que se distancia o grau de parentesco. 50% dos pacientes com transtorno bipolar têm, pelo menos, um dos pais com um transtorno do humor.
Estudo de gêmeos
Os estudos de gêmeos têm mostrado que a taxa de concordância para o transtorno bipolar I em gêmeos monozigóticos é de 33 a 90%, dependendo do estudo em particular. Em contraste, as taxas de concordância entre gêmeos dizigóticos são de cerca de 5 a 25%
Estudos de ligação
A disponibilidade de técnicas modernas de biologia molecular, incluindo polimorfismo de extensão de fragmento de restrição levou a muitos estudos que têm relatado, replicado ou fracassado na replicação de várias associações entre gens específicos ou marcadores genéticos e um dos transtornos do humor. Até o momento, nenhuma associação genética foi consistentemente replicada. A interpretação mais razoável dos estudo é de que os gens particulares identificados nos estudos positivos podem estar envolvidos com a herança genética do transtorno do humor nas famílias estudadas, mas podem não estar envolvidos na herança genética do transtorno do humor em outras famílias. As associações entre o transtorno bipolar I e marcadores genéticos têm sido relatadas para os cromossomos 5, 11 e X. O gene do receptor D1 está localizado no cromossomo 5. O gene para a tirosina hidroxilase, a enzima limitadora do índice de síntese de catecolaminas localiza-se no cromossomo 11.
Cromossomo 11
Um estudo de 1987 relatou uma associação entre o transtorno bipolar I nos membros de uma família da Antiga Ordem Amish e marcadores genéticos no braço curto do cromossomo 11. Com a subseqüente extensão dessa linhagem e o desenvolvimento de transtorno bipolar I em membros da família anteriormente não afetados, a associação estatística deixou de aplicar-se. Esta mudança nos eventos sugeriu, efetivamente, o grau de cautela que deve ser usado na realização e na interpretação de estudos de ligação genética em transtornos mentais.
Cromossomo X
Há muito é sugerida uma ligação entre o transtorno bipolar e uma região do cromossomo X que contém gens para a cegueira para cores e deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase. Como ocorre com a maioria dos estudos de ligação em psiquiatria, a aplicação de técnicas genéticas moleculares tem produzido resultados contraditórios; alguns estudos relatam uma ligação que não é verificada em outros. A interpretação mais conservadora continua sendo a possibilidade de que um gen ligado a X seja um fator no desenvolvimento do transtorno bipolar I em alguns pacientes e famílias.
 

Fatores Psicossociais
Acontecimentos vitais e estresse ambiental
Uma observação clínica já há muito relatada e replicada é a de que acontecimentos vitais estressantes precedem, mais freqüentemente, os primeiros episódios de transtornos do humor do que episódios subseqüentes. Uma teoria proposta para explicar essa observação é a de que o estresse que acompanha o primeiro episódio resultaria em alterações duradouras na biologia do cérebro. Essas alterações duradouras poderiam provocar alterações nos estados funcionais de vários sistemas neurotransmissores e sinalizadores intraneuronais. As mudanças podem incluir até mesmo a perda de neurônios e uma redução excessiva nos contatos sinápticos. O resultado bruto das alterações consiste em um maior risco de sofrer de episódios subseqüentes de transtorno do humor, mesmo na ausência de um estressor externo.
Família
Diversos artigos teóricos e muitos relatos informais envolvem a relação entre o funcionamento da família e o início e curso dos transtornos do humor. Diversos relatos indicam que psicopatologia observada na família durante o período em que o paciente identificado está sendo tratado tende a permanecer mesmo após a recuperação deste. Além disso, o grau de psicopatologia na família pode afetar o índice de recuperação, o retorno dos sintomas e o ajuste pós-recuperação do paciente. Os dados clínicos e informais confirmam a importância clínica de avaliar a vida familiar de um paciente e abordar quaisquer estresses relacionados a ela.
Fatores da Personalidade Pré-Mórbida
Nenhuma evidência sugere que qualquer transtorno da personalidade em particular esteja associado ao transtorno bipolar I. Entretanto, o transtorno distímico e o transtorno ciclotímico estão associados com o desenvolvimento posterior de transtorno bipolar I.
Fatores Piscanalíticos e Psicodinâmicos
Melanie Klein compreendeu os ciclos maníaco-depressivos como um reflexo de um fracasso na infância par estabelecer introjetos de amor. Em seu entender, os pacientes deprimidos sofrem da preocupação de, talvez, terem destruído objetos de amor através de sua própria destrutividade e ganância. Em conseqüência dessa destruição fantasiada, experimentam a perseguição pelos objetos odiados remanescentes. Klein considerava a mania como um conjunto de operações defensivas visando a idealizar os outros, a negar qualquer agressão ou destrutividade em relação a outrem restaurar os objetos de amor perdidos.
 
 

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